segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Quem tem medo de ser rico?


Por Jânsen Leiros Jr.


"Jansen não precisa responder agora, quando puder.
Na tua concepção, diante de tudo que já viu e ouviu, a palavra de Deus diz: "Que é mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma fechadura do que um rico entrar no reino dos céus.
Analisando esta palavra, você acha que muitas pessoas não ficam ricas em virtude de Deus não permitir, pois Deus sabe que perderia esta pessoa para a riqueza?
Qual a tua opinião sobre este assunto?”
Pergunta encaminhada por Whatsapp


"16 E eis que se aproximou dele um jovem, e lhe disse: Mestre, que bem farei para conseguir a vida eterna? 17 Respondeu-lhe ele: Por que me perguntas sobre o que é bom? Um só é bom; mas se é que queres entrar na vida, guarda os mandamentos. 18 Perguntou-lhe ele: Quais? Respondeu Jesus: Não matarás; não adulterarás; não furtarás; não dirás falso testemunho; 19 honra a teu pai e a tua mãe; e amarás o teu próximo como a ti mesmo. 20 Disse-lhe o jovem: Tudo isso tenho guardado; que me falta ainda? 21 Disse-lhe Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, segue- me. 22 Mas o jovem, ouvindo essa palavra, retirou-se triste; porque possuía muitos bens. 23 Disse então Jesus aos seus discípulos: Em verdade vos digo que um rico dificilmente entrará no reino dos céus. 24 E outra vez vos digo que é mais fácil um camelo passar pelo fundo duma agulha, do que entrar um rico no reino de Deus. 25 Quando os seus discípulos ouviram isso, ficaram grandemente maravilhados, e perguntaram: Quem pode, então, ser salvo? 26 Jesus, fixando neles o olhar, respondeu: Aos homens é isso impossível, mas a Deus tudo é possível.”
Mateus 19:16-24

Antes de seguir com qualquer resposta, é muito importante entendermos o que Jesus está falando exatamente, ao afirmar ser mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha, do que um rico entrar no reino dos céus. É muito comum e natural que, ao ouvirmos essa expressão, nossa imaginação nos remeta à cena de um camelo tentando, sem sucesso, passar pelo buraco de uma agulha de costura, como aquelas que nossas avós usavam para fazer bainha, pregar botão, e outros ajustes diversos. Mas não, não é dessa agulha que Jesus está falando.

Antes de falarmos da agulha propriamente dita, é importante atentar para um princípio lógico na colocação de Jesus. Ele não disse ser impossível um rico entrar no reino dos céus. Apenas demonstrou ser mais difícil do que o camelo passar. Ou seja, se ele se referisse a uma agulha de costura, estaria falando no impossível e não do mais difícil. Logo, ainda que não se conheça exatamente de qual agulha fala Jesus nessa passagem, obviamente não poderia ser da agulha que conhecemos comumente.

As agulhas, como podemos ver na ilustração, eram espaços apertados e baixos, que serviam de entrada alternativa na cidade murada. Para passar por essas passagens conhecida como agulhas, era necessário retirar do camelo toda a carga que ele trazia. Além disso o animal precisava ser conduzido com cuidado, abaixando-o pela estreita a baixa abertura. Mas há controvérsias a esse respeito[1].

Na verdade, a teoria certa pouco importa, porque analisando o contexto em que a afirmação é proferida, fica muito claro que Jesus está se referindo às dificuldades que a pessoa rica tem em se despojar de tudo isso para se entregar ao domínio-reino de Deus, acostumada que está ao conforto e ao acesso a bens e serviços que o dinheiro pode proporcionar. O homem rico precisaria desfazer-se das garantias que acreditava ter por conta de suas posses, para aprender a viver apenas da fé no sacrifício do Cordeiro. Afinal, onde estiver o seu tesouro, ali estará também o seu coração[2].

De modo que a preocupação de Jesus não é com o ter, mas sim com o ser. Não há nada de errado em ter dinheiro e poder usufruir do que ele pode proporcionar, mas há tudo de errado em ser dependente das condições e garantias que tal pode dar, como falsa sensação de segurança e bem-estar. Louco, hoje te pedirão a sua alma[3].

Isso posto, voltemos à sua questão, onde Deus poderia impedir algumas pessoas de ficarem ricas, para não perdê-las para o dinheiro, uma vez que por sua onisciência sabe se esse ou aquele indivíduo o trocará pelo dinheiro e suas benesses. Essa me parece uma conjectura estranha, porque se Deus é capaz de impedir a riqueza para manter a lisura espiritual de uma pessoa, não seria também possível a Deus impedir que houvesse qualquer variação de devoção dessa mesma pessoa ao se tornar rica? Ou ainda, considerando que uma maioria esmagadora dos cristãos não possui riqueza alguma, estaria Deus segurando a riqueza de uma tão grande quantidade de gente, que não pode enriquecer porque senão se perderiam na fé?

Me parece curioso que Deus assim fizesse, sendo essa a sua lógica. Porque se para impedir o pecado do homem, ele impedisse uma ou outra condição ou circunstância que pudesse representar tal perigo, ele não teria posto a árvore do conhecimento do bem e do mal no Jardim do Éden. Ora, assim procedendo, o homem, em tese, não pecaria e estaríamos vivendo até hoje no Jardim do Éden.

A lógica que você imagina poder utilizar, é uma armadilha maniqueísta, que tenta encontrar respostas sustentáveis e nobres, para circunstâncias causadas por atitudes nem sempre tão probas assim. Há diversas causas para a não riqueza. Muito mais inclusive do que para a riqueza. Origem familiar, condições de estudos, oportunidades, capacidade profissional individual, empenho, determinação, inteligência, equilíbrio emocional, entre outras. Muitas são as causas possíveis de alguém não atingir a riqueza.

Mas note, não estou querendo dizer com isso que o Senhor não possa realizar em nossas vidas como bem entender. Evidente que sim. Mas me parece pouco provável que sua lógica fosse a sugerida por você, pois ela feriria um princípio básico da relação do homem com Ele mesmo; a liberdade de escolha. Pois que relação se legitimaria sem qualquer opção de não relação? Se Deus impedisse a riqueza para evitar perder o indivíduo para ela, ele igualmente impediria toda sorte de circunstâncias que nos cercam e nos seduzem, nos induzindo ao pecado e a nos afastarmos de Deus. Seríamos por assim dizer, como robôs ou fantoches.

A verdade é que as circunstâncias pouco importam para a relação com Deus. Seja riqueza ou pobreza, seja tranquilidade ou angústia, toda e qualquer condição humana precisa ser entendida como finita e temporal, produzindo no indivíduo a certeza de sua pequenez diante da grandeza do amor de Deus e do seu cuidado. Qualquer que seja sua condição, o indivíduo precisa caminhar na direção da dependência de Deus, seja por saber que tudo o que tem não o pode garantir, seja para saber que o Senhor poderá sempre lhe suprir, por maior e mais profunda seja sua pobreza.

Quer tenhamos dinheiro quer não, sejamos sempre dependentes de Deus



[2]  Mateus 6:21
[3]  Lucas 12:20
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