quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Ano novo vida bem mais. Quer dizer...


         

“O que foi é o que há de ser; e o que se fez, isso se tornará a fazer; nada há, pois, novo debaixo do sol.”
                      Eclesiaste 1:9 - RA

Mais um ano chega ao fim, e com ele a rotineira onda de reflexão coletiva, onde balanços pessoais são proclamados, novos propósitos são definidos, e esperança de melhores oportunidades e condições são mutuamente desejadas. Uns por retribuição, mas outros com sinceros desejos e boa vontade.

É natural e não há nada de errado com isso. A vida é um suceder de ciclos, e desejar que um novo ciclo possa trazer melhores notícias e renovadas alegrias, é um reverdejar de esperanças que faz muito bem ao senso comum e à vida em sociedade. Em termos práticos, porém, nada há de novo debaixo do sol.

A verdade é que um ano novo surge a cada doze meses, como cada novo mês surge a cada trinta dias, e um novo dia a cada amanhecer. Portanto novas oportunidades nos são apresentadas dia-a-dia, no cotidiano de nossas vidas e lutas diárias, constantemente. Mas o que esperamos, no fundo, é que por alguma circunstância mágica, novas condições se alinhem ou realinhem para nos oferecer uma vida melhor, como se a simples mudança de ciclo nos presenteasse com mais prósperas possibilidades.

O que ninguém gosta muito de ler e ouvir, o que obviamente é muitíssimo impopular, é que nossa virada de vida não depende de circunstâncias, mas de atitudes e decisões, para as quais não precisamos necessariamente aguardar o último dia de dezembro para tomá-las. Cada instante vivido é um ciclo a ser virado e cada momento de reflexão, uma oportunidade de renovação de possibilidades e decisões. Um mundo novo pode surgir a cada piscar de olhos. Dependerá sempre do que fazemos com cada oportunidade.

Diferentes e muitos setores da vida são influenciados por nossas decisões. Mas quero me deter naquilo que permeia tudo e toda nossa existência; nossa compreensão de Deus e nossa relação com Ele.

Nada seria mais impopular do que falar de Deus num cenário social como o nosso, onde a simples menção desse vocábulo tende a soar constrangedor, tanto para quem ouve, quanto para quem fala. Ao primeiro porque achará sempre inapropriado e incômodo o tema, e para o segundo porque sofrerá inevitável discriminação velada e cruel. Tudo porque atravessamos um período de ateísmo disfarçado e camuflado de esoterismo e misticismo, onde na prática Deus não passa de uma energia cósmica conveniente, que aplaca a culpa e nos insere numa passiva existência religiosa, incapaz de nos provocar qualquer reflexão mais contundente, ou de exigir um posicionamento comprometedor e contundente.

Por mais que se relute, porém, somos todos diariamente provocados por Deus a uma decisão, por mais sutil que ela possa ser, ou mais despercebida que ela possa se dar. A cada instante em que Sua existência e nossa existência se esbarram pelas esquinas de nossa caminhada, escolhemos ficar com Ele ou lhe darmos as costas. Isso acontece com uma freqüência tão absurdamente grande, que Paulo cita em sua segunda carta aos coríntios; “eis aqui agora o tempo aceitável, eis aqui agora o dia da salvação”. É a vida o instante aceitável. São nossos dias o tempo oportuno.

Assim, se alguém deseja renovadas oportunidades, novas possibilidades e outras condições, deve começar por fazer-se novo e renovado, mudando a própria mente, e renovando as próprias emoções, vivendo uma relação nova e reconciliada com o Senhor de todas as coisas. Não para que assim tenha uma vida melhor, com novas condições e possibilidades, como numa barganha oportunista. Mas para que viva melhor, incondicionalmente, com a confiança e a esperança que produz a paz e o descanso em Deus.


1 Portanto, meus irmãos, por causa da grande misericórdia divina, peço que vocês se ofereçam completamente a Deus como um sacrifício vivo, dedicado ao seu serviço e agradável a ele. Esta é a verdadeira adoração que vocês devem oferecer a Deus. 2 Não vivam como vivem as pessoas deste mundo, mas deixem que Deus os transforme por meio de uma completa mudança da mente de vocês. Assim vocês conhecerão a vontade de Deus, isto é, aquilo que é bom, perfeito e agradável a ele.”
                      Romanos 12:1-2 – NTLH

Que nos novos dias pelos quais avançam a vida e os nossos devaneios, Deus nos inspire a uma vida de comunhão real, plena e revigorante ao seu lado.

sábado, 27 de dezembro de 2014

=> O rico trabalho que empobrece




“Também descobri por que as pessoas se esforçam tanto para ter sucesso no seu trabalho: é porque elas querem ser mais do que os outros. Mas tudo é ilusão. É tudo como correr atrás do vento.”

                      Provérbios 14:23 - RA

Há muita confusão nessa retórica de trabalho e trabalhador. E se já falamos aqui sobre preguiça e diligência, podemos nos concentrar hoje em quem vive para o trabalho, gastando nele as melhores horas, dos melhores dias, da mais produtiva fase da vida. Pois se é verdade que “o trabalho dignifica o homem”, também é verdade que viver em função dele pode dar muito, mas muito trabalho mesmo.

Obviamente não estamos falando do trabalho em si, nem estamos apresentando uma bela desculpa para quem adora encostar-se num barranco. Antes o foco aponta para a motivação de tanto trabalho, e suas conseqüências na vida pessoal de quem troca a vida em família e as outras relações sociais, por horas intermináveis de pretensa dedicação laboral.

Dizemos “pretensa”, porque obviamente o trabalho como cumprimento diligente e responsável de tarefas, não leva ninguém ao ostracismo nem ao afastamento daqueles para quem sua presença é importante. Na verdade, o excesso de trabalho, a troca da vida por horas intermináveis de ocupação, antes de ser causa, na maioria das vezes é sintoma de desequilíbrios outros, nos mais variados segmentos da vida humana, indo desde a necessidade de ocupar-se para fugir de pendências que podem consumir a mente, até a simples falta de vontade de voltar para casa, passando pela necessidade desenfreada de ter sempre mais do que já se tem, e chegar até mais longe do que já se chegou. E é nesse aspecto que iremos nos ater. Na ganância e seus muitos disfarces.

O rei Salomão teve seguramente uma das maiores riquezas da história universal. Sábio e intelectual amealhou ao longo de sua vida uma riqueza tão grande, que por toda Terra era comentada sua riqueza. Reis e rainhas de outras nações atravessavam distâncias enormes apenas para ouvirem sua sabedoria, e com isso lhe presenteavam com grande parte de seus próprios tesouros. Além das alianças e casamentos que lhe fizeram ainda mais rico. Ainda assim, e a despeito de tão grande riqueza, e provavelmente após todo o empenho em entesourar-se, Salomão descreve grande pesar pela dedicação excessiva a essa tarefa.

Claro que quem vive tal desequilíbrio não se posiciona tão francamente nem para si mesmo. A armadilha que leva a essa conduta é sutil. Por isso chamamos de disfarces, porque na verdade criamos uma capa de sobriedade e responsabilidade difícil de ser contra-argumentada, que encobre a verdadeira face da ganância que habita no íntimo. Queremos sempre mais e muito mais... E por quê?

Segundo o próprio Salomão, porque queremos ser mais que os outros. Mas ainda poderíamos acrescentar que também vai aí uma pontinha de necessidade de segurança. Sim, aquela segurança que o poder de compra, que a capacidade de pagamento concede a todos que a têm. Aquela falsa segurança que o dinheiro compra, a qual Jesus chamou de loucura.


15 Então, lhes recomendou: Tende cuidado e guardai-vos de toda e qualquer avareza; porque a vida de um homem não consiste na abundância dos bens que ele possui. 16 E lhes proferiu ainda uma parábola, dizendo: O campo de um homem rico produziu com abundância. 17 E arrazoava consigo mesmo, dizendo: Que farei, pois não tenho onde recolher os meus frutos? 18 E disse: Farei isto: destruirei os meus celeiros, reconstruí-los-ei maiores e aí recolherei todo o meu produto e todos os meus bens. 19 Então, direi à minha alma: tens em depósito muitos bens para muitos anos; descansa, come, bebe e regala-te. 20 Mas Deus lhe disse: Louco, esta noite te pedirão a tua alma; e o que tens preparado, para quem será? 21 Assim é o que entesoura para si mesmo e não é rico para com Deus.”

                      Lucas 12:15-21 - RA

A verdade é que, seja pela vontade de ser mais que os outros, seja pela falsa sensação de segurança que o dinheiro e os bens podem nos dar, o trabalho em excesso empobrece as relações pessoais, à medida que seqüestra-nos do convívio das pessoas a quem queremos bem, que nos demandam tempo, e o mais irônico, exatamente daquelas por quem, em tese, tanto nos esforçamos. Olha aí mais uma armadilha e sutileza da ganância.

É nesse cenário de presumível dedicação e sucesso na vida, que fracassam as relações amorosas, crianças são criadas sem limites, adolescentes se afastam de seus pais, jovens vivem inseguranças inconfessáveis e idosos são abandonados, se não em asilos, em lares onde suas presenças e necessidades são mais um estorvo, do que a feliz companhia de quem pode transmitir muito mais sabedoria que informação. Estamos sempre tão ocupados e preocupados, que não enxergamos quem desfila diante de nossos olhos, pedindo e esperando por atenção. Lutamos para enriquecermos os bolsos e as contas bancárias, mas empobrecemos as relações pessoais e a alma.

Não devemos jamais agir com displicência em nosso trabalho. Muito pelo contrário. Sejamos sempre diligentes e dedicados em tudo que fazemos ou a que nos propusermos realizar. Mas é necessário sabedoria para dosar a mão, para que aquilo que em tese buscamos para sustentar-nos a felicidade e dias mais felizes, não se transforme em correr atrás do vento. Afinal, como bem nos alerta a sabedoria popular, a sutil diferença entre remédio e veneno é a dose.

Que Deus nos faça sábios sempre, para utilizarmos com cada tesouro a medida certa.







sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

=> O preguiçoso, o diligente e La Fontaine



6 Vai ter com a formiga, ó preguiçoso, considera os seus caminhos e sê sábio. 7 Não tendo ela chefe, nem oficial, nem comandante, 8 no estio, prepara o seu pão, na sega, ajunta o seu mantimento. 9 Ó preguiçoso, até quando ficarás deitado? Quando te levantarás do teu sono? 10 Um pouco para dormir, um pouco para tosquenejar, um pouco para encruzar os braços em repouso, 11 assim sobrevirá a tua pobreza como um ladrão, e a tua necessidade, como um homem armado.”
                   Provérbios 6:6-11 - RA


“Em todo trabalho há proveito; meras palavras, porém, levam à penúria”
                  Provérbios 14:23 - RA

Atribuída a Esopo e recontada por Jean de La Fontaine, a fábula A Formiga e A Cigarra esteve presente na infância da maioria de nós, e creio que na minha geração não houve quem não a tivesse conhecido. Contando a desventura da cigarra que por preguiça preferia cantar, enquanto a determinada formiga ajuntava mantimentos para o inverno, por décadas fomos ensinados que quem muito trabalha sempre tem de onde tirar seu sustento.

Já nos tempos modernos e no contexto de corrupção que vivemos em nosso país, o que se desenvolveu nas últimas décadas no imaginário coletivo, foi a idéia de que quem trabalha não tem tempo para ganhar dinheiro, fazendo alusão às oportunidades e idéias (ou paradas) que surgem apenas durante ou em meio a um ambiente de ócio e diversão. Quem trabalha está concentrado em realizar suas tarefas e quase sempre trabalhando para terceiros. É preciso tempo para pensar em como se dar bem. Pois afinal trocamos o sustento e a prosperidade, pelo consumo e propriedade, na escala imaginária que define o conceito sucesso.

Assim a formiga se tornou uma verdadeira operária de visão curta, sem ambição na vida, sem interesse de crescer profissionalmente. Alguém que se ocupa única e exclusivamente com o cotidiano, sem visão lúdica da vida. Uma pessoa totalmente pragmática, incapaz de ser uma visionária, pois no labor extenuante se consomem seus dias.

Já a cigarra tem competências implícitas em seu comportamento. Voltada às artes deve ser sensível, capaz de interpretar comportamentos e atitudes. Deve ser estrategista, pois com olhar mais ampliado, não se ocupa no que é imediato, mas pensa mais longe. Segura, canta com a tranqüilidade de quem se garante e que domina a arte de solucionar problemas quando colocada sobre pressão. E como tem cigarras sendo escolhidas em processos seletivos e ocupando funções em diversas empresas pelo mundo, e em especial no Brasil.

O que muito se confunde, porém, é que trabalho não é apenas o que realizamos durante um período de expediente. Trabalho é o que fazemos quando aplicamos diligentemente nossas competências quando somos demandados, seja para o aqui e agora, seja para o ali e além. Agir diligentemente é aplicarmos empenho e concentração na realização de uma tarefa, atendendo à demanda com integridade e cuidado, para que o melhor resultado seja alcançado e uma necessidade seja satisfeita.

O preguiçoso procrastina. Adia sempre e se desculpa na falsa idéia de que planeja melhor antes de agir. Adia e se ocupa vagamente de tarefas outras que não são prioridades ou não lhe requerem qualquer esforço maior ou verdadeiro, embora faça desse feito, a razão de sua vida, pelo menos até que o impulso de realizar a tarefa primordial passe. A cigarra devaneia sempre.

E é se achando espertas e sagazes, que as cigarras que vivem nos diversos departamentos e empresas pelo país, passam seus dias de improdutividade efetiva. Perguntadas sempre têm prontas uma lista de muitas coisas feitas e a fazer. Mas na verdade, empurram um dia sobre o outro, pilhando-se de pendências e adiamentos sem fim. As cigarras sempre se poupam para uma tarefa que jamais realizam.

Enquanto isso as formigas continuam agindo e realizando. Não param. Sempre ocupadas, são chamadas rotuladas de pessoas de difícil relacionamento, não se dão aos chopps com os colegas. Indisponíveis para qualquer outra coisa que não a realização de suas funções; anti-sociais essas formigas.

É claro que Salomão quando escreve em Provérbios e em Eclesiastes, não tem como pano de fundo a realidade nas empresas de hoje. Ele fala de sua observação da sociedade em que quase todos trabalham num regime de subsistência, plantando e colhendo, cuidando e criando para o sustento seu e de suas numerosas famílias. Nesse contexto, os preguiçosos não tinham muito onde se esconder. Sua inatividade levava a imediata penúria e pobreza, pois nada teria para alimentar a si próprio e aos seus. As estações marcavam o tempo de semear, de arar a terra, de ceifar a colheita. As condições climáticas definiam a qualidade do pasto e obrigavam o manejo das criações para essa ou para aquela região, em busca de um alimento que mantivesse os rebanhos ávidos a fornecerem suas iguarias satisfatoriamente. Tudo isso exigia não só trabalho, mas empenho, acuidade... Diligência!

Digno é o trabalhador do seu salário (1 Timóteo 5:18). A remuneração pelo trabalho que se realiza conforme contrato entre empregado e empregador, é a recompensa que aquele recebe por atender ao que é solicitado por esse. Mas há trabalhador que receberá maior recompensa por sua diligência, esmero e produtividade. Porque a dedicação e o empenho sempre serão recompensados. Seja de que forma for, seja quando for, por quem quer que seja.

Obviamente não estamos falando aqui do trabalhador que cumpre sua jornada como quem caminha para a guilhotina. Imaginem a formiga passando e vendo a cigarra cantarolando feliz e dizendo para si mesma: - Assim é fácil, só cantando, aí sem fazer nada e eu aqui dando o maior duro, suando a camisa do patrão... Já imaginou?! Que formiga rancorosa, chata, irritante e implicante! O trabalhador diligente realiza com prazer suas funções e se realiza nisso. Tem prazer numa tarefa completada e se enche de satisfação ao encerrar mais um dia de trabalho. A formiga resmungona, não passa de uma cigarra covarde, que não teve coragem de trocar as ferramentas pela viola. Foi vencida pela imposição da vida, mas odeia o que faz. Também não faltam cigarras disfarçadas de formigas nas empresas. Não é sem motivo que Paulo adverte:


“Tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como para o Senhor e não para homens, cientes de que recebereis do Senhor a recompensa da herança. A Cristo, o Senhor, é que estais servindo; pois aquele que faz injustiça receberá em troco a injustiça feita; e nisto não há acepção de pessoas.”
                  Colossenses 3:23-25 - RA

O trabalhador diligente, portanto, trabalha com alegria e dedicação, e ainda que não seja reconhecido por seus patrões, tem sua recompensa dada por Deus, que é quem pode conceder as riquezas mais adequadas, conforme a necessidade daquele que se dedica, por sua bondade e graça.

Assim, o preguiçoso não terá do que se gabar. A cigarra não terá o que cantar. Quando pensar em se desculpar, dizendo de que adianta trabalhar porque ninguém dá valor, perceberá que o reconhecimento que se busca nem sempre é o que se vê. Mas sua preguiça e devaneio invariavelmente o levarão a penúria. E o seu desleixo e descaso, jamais o sustentarão minimamente.

Que Deus nos abençoe para servir a quem quer que seja com dedicação e diligência.



segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

=> Olhando nuvens e o ônibus lotado




“Quem fica apenas olhando o vento jamais plantará e quem para observando a passagem das nuvens nada colherá.”
                      Eclesiaste 11:4 - BJK


“A oportunidade passou como ônibus lotado e não fizemos sinal para ele parar.”
                      JLJr

O oportunismo é um conceito incrivelmente controverso em nossa sociedade desde sempre, ou pelo menos desde que me entendo por gente; que é quase igual a “desde sempre”. Ser um oportunista tanto pode significar uma importante e destacável característica em um indivíduo, como pode ser a constatação decepcionante de que o individuo em questão utilizou-se indevidamente de uma oportunidade que não lhe cabia.

A imprensa em sua quase totalidade tem apresentado diversos oportunistas que, diante da possibilidade de enriquecer levianamente, não mediram esforços para alcançarem seus interesses particulares, a despeito dos interesses comuns da população; legítima proprietária do dinheiro público. Na outra ponta, há oportunistas aclamados, como é o caso dos atacantes artilheiros do brasileirão, que com a bela mania de se aproveitarem das oportunidades, nos empolgam com a beleza de suas jogadas.

O que nos interessa hoje, porém, não são os oportunistas, mas sim a oportunidade. Esse instante mágico, que une condição e pretensão, surge como uma janela aberta na dimensão de nosso cotidiano, de duração variada, e que se perpetua na memória pelas conseqüências, tenha sido a oportunidade aproveitada ou perdida. No imaginário coletivo e aceito pelo senso comum, ou a agarramos com “unhas e dentes”, ou ela passa jamais retornando.

Esse conceito, no entanto, faz-nos pensar que a oportunidade está ligada ao acaso, ou seja, circunstâncias convergem em favor de uma determinada condição, que se apresenta para nós como sorte, e que deve ser aproveitada a qualquer custo.

Diferente do senso comum, no entanto, tanto no Antigo Testamento quanto no Novo Testamento, a oportunidade é apresentada como condição oportuna, adequada e propícia para um determinado fim. Jamais como uma condição formada aleatoriamente, mas sim providencialmente conduzida por Deus e disponibilizada ao individuo para realização e cumprimento de sua vontade.

Ainda que a oportunidade possa ser perdida pela rejeição ou opção do ser humano, uma vez que esse sempre será livre para rejeitar a mão estendida de Senhor, nos ocupemos por enquanto das oportunidades perdidas pela falta de fé, confiança e esperança em Deus. Falamos daquelas oportunidades perdidas pelo julgamento de que as condições não são favoráveis, que ainda não é o tempo ideal, ou que esperando um pouco mais antes de a realizarmos, as vantagens serão ainda maiores das que se apresentam possíveis agora. Na verdade desculpas que camuflam falta de confiança num discurso pretensamente racional e equilibrado.

 Quem fica apenas olhando o vento jamais plantará e quem para observando a passagem das nuvens nada colherá. Salomão alerta para essa armadilha. Na esperança de se apresentem condições sempre mais adequadas, ou um atalho que encurte a jornada ou que torne o trabalho mais leve, ficamos de cara para o céu, olhando nuvens passageiras ao sabor do vento. Condições sempre estão em mutação. O mundo não é estático. É preciso dar o primeiro passo para realização da oportunidade.

Sim, porque se é certo que as condições propícias são concedidas por Deus, também é certo que Ele mesmo espera de nós uma atitude de fé, de iniciarmos a realização com nossas forças e disponibilização de todo o nosso empenho e nossa realidade em favor do fim para o qual somos inspirados.


8 Ficarei, porém, em Éfeso até ao Pentecostes; 9 porque uma porta grande e oportuna para o trabalho se me abriu; e há muitos adversários.”
                      1 Coríntios 16:8-9 - RA

O apóstolo Paulo informava a seus leitores que se manteria em Éfeso, onde uma oportunidade lhe havia sido concedida. Não era uma oportunidade para se dar bem. Era uma promessa de grande desgaste, de um trabalho sofrido, de condições propicias para a pregação, ainda que desfavoráveis para a vida. Ou não sabemos todos que até risco de morte Paulo corria com tal decisão? Mas ele não claudicou diante da oportunidade dada por Deus. A obra era do Senhor, mas a execução dele, Paulo. Era por confiança e fé que se arriscava e dedicava ao cumprimento de sua vontade pela oportunidade.


35 Não dizeis vós que ainda há quatro meses até à ceifa? Eu, porém, vos digo: erguei os olhos e vede os campos, pois já branquejam para a ceifa. 36 O ceifeiro recebe desde já a recompensa e entesoura o seu fruto para a vida eterna; e, dessarte, se alegram tanto o semeador como o ceifeiro. 37 Pois, no caso, é verdadeiro o ditado: Um é o semeador, e outro é o ceifeiro. 38 Eu vos enviei para ceifar o que não semeastes; outros trabalharam, e vós entrastes no seu trabalho.”
                      João 4:35-38 - RA

Fazendo comparação com o tempo para a colheita, Jesus confronta seus discípulos. Ainda que as circunstâncias apontem para outras atitudes, estratégias e prazos, a realidade da oportunidade está diante dos seus olhos. Não importa se o tempo adequado ainda não tenha chegado, a oportunidade está aqui e é agora. O campo está pronto para a colheita, a despeito das previsões. Na verdade, conclui Jesus em Mateus 9:37 e 38, o que falta são ceifeiros dispostos a iniciarem já a colheita; há poucos. Precisamos de mais ceifeiros. Outra vez a realização cabe a nós.

Portanto precisamos descer do muro. Começar a caminhada. Entrar na seara e colher no campo. Precisamos parar de esperar o ônibus mais vazio, o taxi mais espaçoso, o passe magistral... O melhor vento. Agir na direção da realização da vontade de Deus dependerá de nossa confiança e fé, discernindo realidade e circunstância. A oportunidade? Está diante de nossos olhos.


terça-feira, 2 de dezembro de 2014

=> Por que o irmão não faz como eu?




“Deus não criou robôs, não nos fabricou em série. Cada um de nós é um ser único que revela em si mesmo uma individualidade plena, ainda que plural, porque capaz de se torna um com o outro e com muitos, sem deixar de ser único.”
                      JLjr


"4 Ora, os dons são diversos, mas o Espírito é o mesmo. 5 E também há diversidade nos serviços, mas o Senhor é o mesmo. 6 E há diversidade nas realizações, mas o mesmo Deus é quem opera tudo em todos. 7 A manifestação do Espírito é concedida a cada um visando a um fim proveitoso. 8 Porque a um é dada, mediante o Espírito, a palavra da sabedoria; e a outro, segundo o mesmo Espírito, a palavra do conhecimento; 9 a outro, no mesmo Espírito, a fé; e a outro, no mesmo Espírito, dons de curar; 10 a outro, operações de milagres; a outro, profecia; a outro, discernimento de espíritos; a um, variedade de línguas; e a outro, capacidade para interpretá-las. 11 Mas um só e o mesmo Espírito realiza todas estas coisas, distribuindo-as, como lhe apraz, a cada um, individualmente."
                      1 Coríntios 12:4-11 – RA


“E ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas e outros para pastores e mestres,”
                      Efésios 4:11 - RA

A multiplicidade de manifestações dos dons concedidos pelo Espírito de Deus, por diversas vezes esteve na pauta de defesa de que cada um possui uma forma única e particular, no serviço do Reino de Deus, para edificação do corpo de Cristo. O que pouca gente ressalta, contudo, é que o coração humano, por vaidade ou ciúme, ou pelas duas coisas, leva determinadas pessoas a desqualificarem ou mesmo menosprezarem a importância deste ou daquele dom, na tentativa infantil de realçar o seu próprio dom, buscando com isso notoriedade e distinção.

Esse tipo de atitude, no entanto, não é nova. Muito pelo contrário. O apóstolo Paulo enfrentou esse problema na igreja de Corinto, e por essa razão ele faz a defesa de que o mesmo Espírito é que concede os diferentes dons, com a mesma importância e valor para o amadurecimento da igreja. Já naquela época e pouquíssimo tempo depois da ressurreição de Jesus, membros da igreja já se jactavam por terem algum dom que os valorizava, a ponto de lhes darem presumida importância superior e destaque no seio da igreja.

Pelo senso comum, esse comportamento é reprovado entre os grupos eclesiásticos. Na prática, porém, a situação se desdobra diferente da teoria e do aceitável. Porque ainda que diferentes dons sejam aceitos como utilidades diversificadas para a capacitação das possibilidades da igreja, o que se exige dos que participam de algumas congregações, é que seus comportamentos, seus impulsos e traços de personalidade e até a forma de adoração, sejam iguais ou se manifestem iguais aos demais. Por quê o irmão não faz como eu?

Esse maniqueísmo é sutil, mas é forte e cruel com quem se atreve a não embarcar no modelo adotado pela maioria, que é entendido como o único modelo aceitável e aferidor de piedade e firmeza espiritual. Esse dualismo que estabelece o pensamento implícito do quem não está comigo está contra mim, gera pensamento segregador, que não aceita no outro, reações, posicionamentos ou preferências diferentes, divergentes e particulares.

O que na prática não se aceita, é que as pessoas têm histórias diferentes, costumes diferentes, predileções outras, não necessariamente idênticas ou mesmo compatíveis entre si. Quem cruza os braços não é menos crente que quem levanta as mãos ao cantar. Quem solta um aleluia durante as orações ou durante a adoração, não é mais especial do que ninguém. E não; ninguém é obrigado a fazer igual na hora em que alguém diz que isso deve ou não deve ser feito. Unidade na fé não é necessariamente uma manifestação uniforme e padronizada de espiritualidade. Mas a cumplicidade e a concordância naquilo em que cremos; Cristo em vós, a esperança da glória.

Ora, se as habilidades com que somos dotados atendem a uma variedade importante no cumprimento dos propósitos de Deus, que dirão nossas personalidades e nossas histórias, que nos fazem diferentes e divergentes, num mosaico de capacitações e atitudes inerentes a qualquer grupo humano. Por isso Paulo insistia; “como resultado disso, já não existem mais judeus e não-judeus, circuncidados e não-circuncidados, não-civilizados, selvagens, escravos ou pessoas livres, mas Cristo é tudo e está em todos” (Colossenses 3:11 – NTLH). Na variedade de personalidades, etnias, condição social e comportamento, opera a multiplicidade de possibilidades de auxílio mútuo e amparo.

É necessário, portanto, aceitar que entre nós há indivíduos que respondem diferentemente aos estímulos e provocações do Espírito de Deus, que atua individualmente para que não haja absorção ou programação, mas uma resistência à uniformidade. Nossos ajuntamentos e celebrações de modo algum podem se assemelhar a exercícios de pelotões de robôs, obedientes a comandos mecânicos. Antes, pelo ensinamento de que misericórdia quero e não sacrifícios, sejamos espontâneos, voluntários e amorosos, agindo com singeleza de coração. Usando de verdade e autenticidade diante do Pai.

Que o Senhor nos sustente por sua graça, mantendo-nos na pluralidade dos dons e das atitudes, para que a riqueza de seu poder e propósitos continue a nos capacitar a atingir diferentes culturas e regiões, para a sua glória.
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