“Sempre ouvi dizer que o sucesso
está nos detalhes. Se isso é verdade, grande parte do insucesso das políticas
públicas está exatamente na distância entre o que se planeja e o que é efetivamente
realizado. Ora por falta de vontade e efetividade, ora pelo não engajamento
ideológico da equipe que deveria realizar o planejado. O problema às vezes é de
essência e de gente”
JLjr
Eu me lembro bem, não faz muito tempo,
durante a campanha eleitoral para a presidência da república, o Exame Nacional
do Ensino Médio, o ENEM, foi amplamente utilizado como exemplo de gestão e de
política publica para a Educação. Um grande feito desse ministério e do governo
do PT. Um sucesso que particularmente questiono, não tanto por sua pertinência,
mas pelos detalhes logísticos que, desconsiderados, podem interferir para
sempre na vida de tantos jovens que sonham com o ingresso em uma faculdade.
Podemos começar com a espetacular definição dos locais de
prova. Um processo que, se tem alguma lógica, não atende ao mínimo de coerência
na distribuição dos candidatos pelas unidades. Um maciço e desnecessário
cruzamento de bairros ainda que próximos, mas que na prática se torna intransponível,
dado o trânsito extra de um dia de prova. Na região de Jacarepaguá, aqui no Rio
de Janeiro, candidatos residentes na Taquara, Tanque e Curicica, lotados em
unidades da Freguesia e vice-versa. Resultado; só na sala em que prestei exame
mais da metade não apareceu. Minha filha relatou mesma proporção onde ela fez
sua prova. Ah! Sim. Eu fiz o ENEM, então estou falando como quem participou do
processo.
Me pareceu que por principio os
candidatos foram distribuídos segundo a letra inicial de seus nomes, dentro de
uma determinada região geográfica. Um critério que pode até funcionar em
cidades pequenas ou em lugares onde o trânsito local não ofereça um
engarrafamento tão absurdo num sábado de prova nacional. Numa grande cidade
como o Rio, o critério mais simples seria o do CEP do candidato relacionado ao
CEP da unidade mais próxima. Assim evitaríamos deslocamentos significativos,
como o que realizamos ano passado, quando morando em Colégio, minha filha foi
lotada em uma unidade no Engenho Novo, mais de quinze quilômetros de distância,
que foram percorridos em duas horas de carro, sempre buscando caminhos
alternativos, tamanho o nó no trânsito daquele dia. Imaginei que a experiência
do ano passado tivesse servido às autoridades e responsáveis, para que tal circunstância
não se repetisse. Doce ilusão.
Depois voltarei na questão logística.
Porque uma outra e importante preocupação foi a relação “quantidade de
questões x tempo de prova” Tenho a impressão que o iluminado que calculou
isso jamais realizou uma prova, ou se o fez, sempre teve o gabarito no colo.
Questões longas que requeriam excessivo cuidado na leitura, tanto do enunciado
quanto das alternativas, jamais poderiam atender ao coeficiente de três minutos
por questão, sem contar que uma grande quantidade das noventa questões demandava
cálculo. Tanto é verdade, que na prova da UERJ o quoeficiente é de quatro
minutos por questão. Presenciei muitos candidatos apressando suas marcações ou
fazendo as últimas quinze questões de qualquer forma, para não correrem o risco
de não completarem a prova.
Voltando, alguém aí falou em trânsito?
Durante a semana, quem trafega por qualquer região no Rio de Janeiro, e sei que
também em outras cidades como São Paulo, esbarra até sem querer num contingente
imensurável de agentes de trânsito. São tantos, que lotariam facilmente um
Maracanã em dia de decisão. Mas hoje, um dia de evento nacional, quando que uma
quantidade enorme de candidatos se desloca pela cidade, não havia qualquer
agente da CET-Rio nas ruas auxiliando o escoamento do trânsito. Resultado? Nó
na Taquara, nó no Pechincha e na Freguesia, para ficarmos nos bairros em que
fui testemunha ocular do fato.
Alguém poderia argumentar que não são
problemas assim tão graves e que não dizem respeito diretamente ao ENEM.
Concordo e descordo. Porque se é verdade que o exame propriamente dito não
deixou de ter sua aplicação realizada, por outro lado a falta de cuidado com
pequenos detalhes que acarretam grandes transtornos, demonstra ausência de
planejamento e de coordenação do aplicador nacional do exame com as autoridades
locais, para garantir que a totalidade dos candidatos inscritos consiga ter o
acesso necessário às suas unidades de prova.
Pra piorar a sensação de quem foi
impedido de prestar o exame por circunstâncias que estiveram além de suas
possibilidades e previsibilidades, a Jornal Nacional em sua edição de hoje,
ressalta apenas que alguns “atrasados perdem a prova por se atrasarem”,
deixando de prestar um importante serviço, que seria a cobrança desses cuidados
por parte dos organizadores. Um desserviço a que já vimos nos acostumando
ultimamente.
Por fim, amanhã teremos mais. Domingo
sem tanto carro na rua e bem menos candidatos acorrendo aos locais de prova. O
ENEM será um sucesso! E com a contabilização do total de inscritos, não dos que
conseguiram realizá-lo.
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