Por Jânsen Leiros Jr.
“18 No amor não há medo antes o
perfeito amor lança fora o medo; porque o medo envolve castigo; e quem tem medo
não está aperfeiçoado no amor. 19 Nós amamos, porque ele nos amou
primeiro. 20 Se alguém diz: Eu amo a Deus, e
odeia a seu irmão, é mentiroso. Pois quem não ama a seu irmão, ao qual viu, não
pode amar a Deus, a quem não viu. 21 E dele temos este mandamento,
que quem ama a Deus ame também a seu irmão."
1 João 4:18-21 - JFA
É impressionante como temos a
facilidade de inverter a prioridade de tudo na vida. Ainda que racionalmente
tenhamos muito bem estabelecido o que devemos realizar primeiro, buscar antes
de tudo ou pensar na frente de qualquer outra coisa, quase sempre nos flagramos
corrompendo a ordem do que nós mesmos planejamos ou pretendemos. Deixamos o que
importa para depois de um sem número
de distrações ou futilidades, que a rigor sequer mereceriam qualquer tempo ou
atenção de nossa parte.
Os motivos para essas inversões são
muitos e de variadas possibilidades, e por isso não nos deteremos neles nesse
texto. Nosso objetivo aqui será apontar para a importância que é prioritário,
daquilo que é essencial para a vida. A idéia é nos dedicarmos ao que
efetivamente importa. E aqui já fazemos uma escolha; falarmos das prioridades e não das distrações. Mesmo que um dia falar das
distrações seja prioridade, aqui, nesse momento, não é. E por isso escolhemos
deixá-las de lado.
Entre os diversos fatores que
constituem o cotidiano de nossas vidas, os relacionamentos se apresentam como
aqueles que permeia toda a existência humana. Nascemos de uma relação, qualquer
que seja sua profundidade ou pertinência. Vivemos relacionamentos desde que
nascemos. E ao longo da vida, desenvolveremos relações diversas que se estenderão
desde nossos coleguinhas de infância, até a última pessoa com quem você falou há
poucos instantes, passando por professores, amigos adolescentes, paqueras, o
porteiro do prédio, empregados e patrões.
Praticamente tudo o que fazemos na vida
demanda, em maior ou menor grau, algum relacionamento com alguém. Também em
maior ou menor grau haverá alguma troca, algum envolvimento, algum sentimento.
Nenhum encontro é nulo, por mais indiferente que se possa encará-lo. Toda relação
provocará uma sensação. E dessa sensação brotarão reações que poderão variar
conforme nossas predisposições em sentir e agir.
O corriqueiro em nossos dias, porém, é
definir a qualidade de atenção disponibilizada a uma determinada relação, pelo
grau de retorno que essa mesma relação poderá nos proporcionar, conforme nossas
necessidades ou conveniências. Assim, se me empenho em ser simpático com o
porteiro do prédio em que trabalho, é porque volta e meia esqueço o crachá sobre
a mesa e ele me deixa passar sem precisar portá-lo. Se você trata com cordialidade
o manobrista do estacionamento, é porque ele sempre lhe arruma uma vaga, mesmo
com o pátio lotado. O trato com o cliente é amistoso... Sim, mas afinal ele paga
o meu salário.
Ou seja, a maneira com que nos
relacionamos em nosso dia a dia sofre muito mais influência de nossos
interesses, do que de nossa disposição de tratar todas as relações com
cordialidade, boa vontade e amor. E por isso, desde que não haja qualquer
utilidade prática, imediata ou futura, em qualquer que seja a relação, nos
condicionamos a não despender tempo ou atenção a ela; agimos com implacável
desprezo.
Acontece que, ao dizer que devemos amar o nosso próximo como a nós mesmos,
Jesus transformou TODAS as pessoas em nós
mesmos, e eu não conheço ninguém que se despreze ou seja indiferente a si
mesmo, por mais que aparentemente possa parecer não se valorizar como deveria.
Seja o próximo um próximo ou distante, de interesse iminente ou
eventual, útil ou não, conveniente ou não, é preciso valorizar essa relação
sempre que ela existir. Porque o amor é um sentimento transbordante, que não
obedece a convenções de oportunidades e aplicações, sendo naturalmente, quando
existente, oportuno e aplicável.
É claro que ninguém imagina que do
nada alguém passe a amar o próximo, apenas por exigência ou por mandamento. O amor seja não fingido[1],
de modo que não nasce de atitudes auto-impostas, ou de cheklists presos no
espelho do banheiro. Mas também é verdade que o amor precisa ser exercitado. Assim como alguns músculos
que existem em nossos corpos, podem por falta de uso atrofiarem, a falta de prática
do amor pode nos tornar apáticos em nossas relações, permitindo que aquilo que é
na verdade acidental ou colateral, tome o lugar do que é essencial e desejável.
Por que damos mais importância às
nossas conveniências e aos nossos interesses, mesmo no âmbito de relações mais
relevantes? Porque no fundo, damos muito mais valor a nós mesmos e ao que
pretendemos com essa relação, do que à manutenção de relacionamentos saudáveis
e amorosos. Farinha pouca meu pirão
primeiro, diz o provérbio popular; seja com quem for. E assim alimentamos e
desenvolvemos relações condicionadas ao pragmatismo do oportunismo e da
utilidade.
Esse
povo honra-me com lábios, mas seus coração está longe de mim[2].
Imagino o pesar no coração de Deus ao proferir essa frase, mais tarde repetida
por Jesus aos fariseus. O povo tinha com ele uma relação de conveniência e
oportunismo. Era evidente que o buscavam com outras intenções, que não a de
terem uma relação de intimidade e amor. Estar próximo de Deus lhes era
interessante e proveitoso. Esperavam algo em troca. O valor não estava na relação,
mas na eventual recompensa.
Por outro lado, o Samaritano na
estrada para Jericó não tinha qualquer outra intenção, senão tratar e cuidar
daquele homem tão maltratado pelos salteadores. Ele não esperava qualquer
retorno dele. Coberto de ferimentos e roubado de seus pertences, ele provavelmente
não teria como realizar qualquer ressarcimento do que com ele foi gasto pelo Samaritano.
Pleno de compaixão, e no exercício de profundo e incondicional amor, ele tratou
daquele homem jogado à beira da estrada, o deixou em uma hospedaria, e ainda
autorizou, sem medida, qualquer gasto que se fizesse necessário para que aquele
homem fosse recuperado de seu estado físico. O que ele esperava em troca? Nada.
Portanto relações valorizadas têm seu
valor nas pessoas e não naquilo que elas nos possam proporcionar. E por isso
mesmo essas pessoas não nos podem ser indiferentes, simples passantes, que
nenhuma influencia têm em nossas vidas. É preciso exercitar o amor e o cuidado.
Devemos priorizar as pessoas e ter por elas paixão e compaixão, para que
valorizadas, possam ser as verdadeiras jóias de todos os nossos relacionamentos.
O amor precisa ser em nós natural, transbordante e irresistível.
Que Deus nos inspire a nutrir com amor
e verdade, todas as nossas relações. Para que pessoas e não coisas, e o
que elas são, e não o que podem dar ou proporcionar, sejam as reais motivações de
nossos corações e mentes, no exercício excelente do amor.