“No dia seguinte João viu a
Jesus, que vinha para ele, e disse: Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado
do mundo."
João 1:29 - RA
“Expurgai o fermento velho, para
que sejais massa nova, assim como sois sem fermento. Porque Cristo, nossa
páscoa, já foi sacrificado."
1 Coríntios 5:7 - RA
“E disse-me um dentre os anciãos:
Não chores; eis que o Leão da tribo de Judá, a raiz de Davi, venceu para abrir
o livro e romper os sete selos."
Apocalipse 5:5 - RA
Mesmo o mais desavisado e incauto
observador da história, sabe que poderosos impérios se seguiram na história da
humanidade. Na escola estudamos com mais freqüência e detalhes os impérios
egípcio, babilônico, persa, grego e o romano. Pelo menos na minha escola foi
assim. Mas também não importa, pois não falaremos em nenhum deles agora, senão
para alusão de seus poderes e domínios.
Qualquer que fosse sua origem, todos
os grandes impérios tinham por característica a imposição pela força. E pelo
medo a que eram submetidos, os dominados sempre se curvaram com uma
subserviência conveniente, estratégica e sobrevivente. Mas em nada submissa. E
aqui vale a licença poética para diferençar subserviência de submissão. Mas
falaremos disso mais à frente.
Obrigados a submeterem-se ao poder de
seus dominadores, diversos povos subjugados alimentavam sonho de liberdade e
expulsão do dominador de suas terras, e de suas vidas cotidianas. Ora, se tais
dominadores se impuseram pela força, nada mais óbvio que se imaginasse a
liberdade como resultado de aplicação de força ainda maior, mais poderosa,
temida sobre todas as demais.
Entre os povos dominados por esses
poderosos impérios, esteve com certo destaque o povo de Israel. Ainda que a
Bíblia narre com clareza a ação divina corrigindo seu povo por meio da
dominação por povos chamados pagãos, jamais tal domínio foi visto com bons
olhos, ou mesmo arrefeceu em seus contemporâneos, o sonho de liberdade e por
que não dizer também, vingança, pela opressão e domínio.
Nesse cenário, a identificação do
sonho de liberdade com a figura do leão, poderoso e feroz foi mais do que natural.
Outros povos ao longo da história reeditaram tal identidade, mas em particular,
o povo judeu viveu a esperança no Leão da tribo de Judá, por cujo simples
rugido tremiam os inimigos e a uma batiam em retirada. O poder e a força
representada pela figura do leão, era tudo o que lhes convinha utilizar, na
esperança de liberdade e redenção nacional através da força. Uma força
necessariamente superior e mais poderosa que a de seus dominadores.
Ainda que até agora tenhamos falado de
nações e povos dominados, em populações inteiras sofrendo a opressão inimiga,
elas bem que personificam em boa medida nossos comportamentos individuais e até
certo ponto naturais, diante das circunstâncias e desafios que a vida nos impõe
no cotidiano de nossos dias. Sim, porque os povos dominadores de ontem, são
substituídos em nossa realidade particular e cotidiana, pelos patrões e chefes no
trabalho, por colegas que por ganância ou inveja almejam nossas posições, ou
por qualquer outra pessoa que se encaixe nessa condição de opressor, e que se
torna objeto de nosso mais profundo sentimento de liberdade e por que não
dizer, eliminação.
Legítimo ou não, volta e meia nos
flagramos sonhando com a liberdade. Volta e meia sonhamos e planejamos ser
livres. E se o domínio percebido é forte e opressor, tão mais forte e intenso é
o sentimento de que a revolta é o caminho para essa liberdade. Preciso ser mais forte que o dominador.
Preciso de força e poder. Preciso feri-lo e matá-lo. Obviamente falo do que
passa pela cabeça. Na prática remoemos apenas, e vivemos essa guerra hipotética
diariamente. Mas também é verdade que o dia da revolta às vezes chega para
alguns.
Falando do que nos é pessoal, fica
mais fácil entender porque os judeus esperavam tanto por um Messias poderoso,
um Messias arrasador. Um Ungido forte como um leão, capaz de ferir o inimigo
com o olhar e colocá-los para correr apenas com seu rugido feroz. Sonhamos dar
esse rugido contra nossos opressores diários. Bradamos imaginariamente no
cafezinho da esquina, na sala de aula, na sala do chefe, no trânsito, em casa.
Bradamos um rugido silencioso que ecoa internamente, revelando-nos o quanto
gostaríamos de ser viris e poderosos como um leão.
Enquanto o povo judeu aguardava um
Messias poderoso, surge um carpinteiro, eloqüente sim, mas completamente avesso
às armas e resistente a força física. Em vez de revidar ao romano violento ele
incita a oferecer a outra face. Em vez de lutar pela capa arrancada à força,
ele manda entregar também a túnica. Quando oprimido a carregar a carga do
romano por uma milha, ele diz para caminhar com esse mesmo opressor duas
milhas. Para quem aguardava um leão, é bem natural que não haja nada além de
decepção.
Na verdade, o que buscamos em nossa
vida, é a confiança de que sempre poderemos andar seguros. E nada melhor para
nos dar segurança, do que a sensação de que os outros nos enxergam poderosos e
capazes de reagir com força superior à investida, qualquer que seja sua
natureza e intenção. E assim, mesmo que nossa realidade individual seja bem
diferente, nos vestimos de leão, andamos como leão, olhamos como leão. Tentamos
nos impor como leão.
Nada
disso, nos diz Jesus no sermão do monte. Em vez de
altivos, pobres de espírito. Em vez de risonhos, chorosos. Em vez de viris,
mansos. Mansos? Mas leão não é manso! Leão é feroz. Pois então, em vez de
querer ser um leão, que tal experimentar ser cordeiro? Porque a falsa sensação
de poder que o leão pode trazer, não é mais poderosa do que a força e a
liberdade que a submissão a Deus é capaz de proporcionar. Submissão não é
subserviência. Esta não passa de servidão bajuladora que se pretende a oportuna
barganha. Submissão é a sujeição livre, obediente e humilde, de quem é acolhido
e não dominado.
Ser cordeiro não é sinônimo de
fraqueza. Enquanto o leão é a imagem da força e do poder, o cordeiro é a imagem
da submissão e do sacrifício voluntário. A mansidão é antes de uma resignação,
uma opção pela paz. Não por falta de força ou poder, mas por amor. Jesus
poderia sem sombra de dúvida ter sido um leão, como ainda o veremos ser como
narra o Apocalipse. Mas naqueles dias, optou por ser um cordeiro. O nosso
Cordeiro Pascal, que a exemplo do cordeiro que livrou da morte os primogênitos
judeus e libertou o povo do cativeiro no Egito, também nos livra do domínio da
morte. Não por força, mas por mansidão e sacrifício próprio. Dando-se à morte
por optar pela vida de muitos.
E nós? E eu? O que quero ser? Um leão
bramindo e assustando, por também assustado, tentando manter longe os inimigos
e opressores? Ou um cordeiro, manso e seguro, garantido de que a vida é cuidada
pelo pastor de nossas almas? A quem submissos, por amor, nos sujeitamos a uma
vida que aguarda o seu Reino. O Reino de um leão, conquistado por um cordeiro.
Que nessa páscoa, nem ovos, nem
coelhos ou mesmo chocolate, nos sejam mais simbólicos do amor de Deus, do que o
seu Cordeiro, que esvaziou-se do Leão, para calado dar-se em sacrifício pela
humanidade, por mim, e por você.