“24 Contudo, Tomé, um dos doze,
chamado Dídimo, não estava com eles quando Jesus apareceu. 25
Os outros discípulos, no entanto, anunciaram-lhe: “Nós vimos o Senhor!” Mas ele
respondeu-lhes: “Se eu não vir as marcas dos pregos nas suas mãos, não colocar
o meu dedo onde estavam os pregos e não puser a minha mão no seu lado, não
acreditarei.”
26
Após oito dias, os discípulos estavam reunidos ali outra vez, e Tomé estava com
eles. As portas estavam trancadas; quando Jesus apareceu, pôs-se no meio deles
e disse: “A paz seja convosco!” 27 Então dirigiu-se a Tomé,
dizendo: “Coloca o teu dedo aqui; vê as minhas mãos. Estende tua mão e coloca-a
no meu lado. Agora não sejas um incrédulo, mas crente.” 28
E Tomé confessou a Jesus: “Meu Senhor e meu Deus!” 29
Ao que Jesus lhe afirmou: “Tomé, porque me viste, acreditaste? Bem-Aventurados
os que não viram e creram!"
João 20:24-29 - KJA
Quando decidi criar esse blog, pretendia
ocupar-me com abordagens diferentes, mas nem sempre e não necessariamente contrárias.
Na prática, significaria que os conceitos teológicos comumente aceitos seriam
em sua maioria os mesmos, mas as abordagens e as argumentações buscariam
observar e encaminhar os assuntos por trilhos menos frios e duros, do que aqueles
por quais costumam trilhar o pensamento apologético de comprovações e de certezas. E nesse tema, em especial, não
poderia ser diferente.
Assim, em vez de gastarmos tempos
infinitos na discussão sobre a inerrância da Bíblia e na defesa de sua inspiração,
pretendendo apresentar provas que garantam uma crença insofismável naquilo que ela nos relata, prefiro deixar que o exercício
epistemológico se encarregue de defender-se a si mesmo, garantindo-se ou não por
afirmações que se pretendem absolutas e inequívocas. Na verdade há mestres maravilhosos
que fizeram isso com maestria. Eu, por minha vez, prefiro concentrar-me no objetivo
final da narrativa bíblica, cujo exercício de exposição dispensa o enfadonho labor
da comprovação, trocando a exaustão do fato, pela sensação do afago, ainda que sem
desprezar a verdade; mas essa desejada
e percebida, jamais imposta ou obstinada. A Bíblia pretende tão somente revelar
Deus, anunciando seu amor e apresentando sua redenção.
Partindo da premissa de que Deus não é
um ídolo, e muito menos um objeto inanimado, a cuja observação e estudo se
presta imóvel, aguardando impassível pelo resultado das análises humanas, não
podemos e nem devemos implementar avaliação qualquer que seja, partindo do pressuposto
de que nossas conclusões de hoje serão as mesmas de amanhã ou depois. Estaria assim
hereticamente defendendo alguma mutabilidade em Deus? Não, de forma alguma, mas
é impossível imaginar que tanto as circunstâncias dos observadores, quanto o
momento histórico em que tais observações acontecem, não influenciam direta ou
indiretamente o resultado de qualquer análise responsável e honesta. Em outras
palavras, o encontro com Deus se altera em sua ambiência e relevância, bem como
em seus conteúdos e propósitos, a medida que avançam no tempo e na história da
humanidade, e por suas próprias percepções do mundo em que habita. Sim, porque
ainda que Deus seja o mesmo, o homem
que com Ele se relaciona e o observa obviamente não o é, transformado que foi
pela soma dos encontros anteriormente protagonizados por seus antepassados. O encontro
com Deus é necessariamente transformador.
Desse modo, entendo que se torna mais
pragmática e enriquecedora, a experiência da análise das afirmações bíblicas, não
a partir dos atributos imutáveis de Deus, ou das comprovações sôfregas de sua
pertinência na atualidade, mas a partir da narrativa simples e por assim dizer
romanceada de seus fatos e ilustrações em seus respectivos
contextos históricos, nas quais Deus se revela em todos os aspectos de seu ser,
convivendo com as oscilações e contradições da humanidade em transformação. Uma
história de relacionamento dinâmico, em que as circunstâncias se alternam no
desvelo de Suas pretensões e vontade. Mais do que um manual contendo regras de
conduta e bem viver, a Bíblia é uma fonte inesgotável de histórias e possibilidades
da relação Deus-humanidade, onde o seu amor se apresenta desde a criação, atraindo
essa mesma criatura de volta para perto de Si mesmo, e redimindo-a de vez, ao
fazer-se tão humano, quanto mais humano um homem
pode ser.
Por essa razão, a Bíblia assim
considerada, como o grande romance da relação de Deus com a humanidade, ganha
aspectos de causa e efeito simultaneamente e em um só volume, sendo responsável
tanto por levar o homem ao conhecimento do que o encontro com Deus é capaz de
realizar em sua vida, quanto por servir de sustentação e orientação para a caminhada
de fortalecimento nessa mesma relação. Ou seja, a Bíblia tanto exerce o fascínio
da atração, quanto acolhe o desejo pelo conhecimento do Deus a quem anuncia e
revela. Sendo assim, não foi a verdade
garantida ou comprovada que atraiu o crente à Bíblia, mas o amor revelado e sentido na seqüência de suas páginas. Realidade
ou não, fato ou mito, o amor de Deus revelado e concebido arrebata o homem que se enche de amor de volta,
preferindo-O a tudo o mais que viveu, vive ou poderia viver adiante.
Imagino que a essa altura, os
defensores da teologia clássica e das acadêmicas defesas apologéticas já tenham
rasgado suas vestes, ou popularmente falando, já tenham colocado meu nome na boca do sapo. Azar, porque ainda lhes darei
razões supinamente mais contundentes para me execrarem. Isso porque, segundo penso,
qualquer comprovação que se pretenda tornar irrefutável aquilo que afirma a Bíblia,
retira dela o propósito de registro da história da fé humana e da relação de
Deus com o homem, passando a lhe
conferir um perfil de livro técnico-científico,
onde se registram fatos comprovados e
por assim dizer irrefutáveis. Em outras palavras, a Palavra deixa de ser uma revelação para ser uma constatação. E por óbvia
constatação, não mais uma comunicação de fé, mas sim de inevitável realidade,
incondicional e irresistível. A verdade comprovada se impõe à opção de nela se
crer. Suprime a liberdade de se colocar ou não fé.
Creio que em outro texto eu já tenha
utilizado essa analogia, mas a repetirei aqui por ser bastante adequada, ainda
que resumidamente. Na antiguidade cria-se que a Terra era quadrada ou um plano
que se estendia até ao horizonte dos olhos. Galileu foi condenado por afirmar não
só que ela era redonda, mas que também era ela que girava em volta do sol, e não
o contrário. Por tempos a discussão se arrastou, e ainda algumas pessoas
resistiam com alguma dúvida disso, até que a primeira foto da Terra foi tirada
a partir do espaço. Pronto, não cabia mais qualquer dúvida. Comprovada que foi
a tese de que a Terra é redonda
e que é ela que orbita em
volta do sol, quem tinha convicção disso passou a ter certeza. E por sua vez,
quem duvidava deixou de ter o privilégio da dúvida, sob pena de ser considerado
louco, por alienado que se fizesse de uma realidade incontestável. Assim não há
mais crença ou fé em um pressuposto. Uma prova inconteste que aceita-se irresistível,
acata-se, sem qualquer valor de crença.
“1 Ora, a fé é a certeza de que
haveremos de receber o que esperamos, e a prova daquilo que não podemos ver. 2
Porquanto foi mediante a fé que os antigos receberam bom testemunho.
3
Pela fé compreendemos que o Universo foi criado por intermédio da Palavra de
Deus e que aquilo que pode ser visto foi produzido a partir daquilo que não se
vê. "
Hebreus 11:1-3
Portanto, para que haja fé não pode
mesmo haver comprovação. Na fé, a verdade que se percebe não se constata; é
antes uma convicção incondicional que independe da realidade. Logo, a verdade
da fé é aquilo que se comprova apenas pela sensação de se estar no caminho
certo. Suspeitas tão intensamente palpáveis, quanto concretas são suas
esperanças. Um fundamento do que se espera surgir do nada.
Ora, então se alguém depende de provas
ou indícios táteis para crer em Deus e naquilo que a Bíblia narra, ainda que
entenda a algo semelhante ter alcançado, nada sabe, nada entende, e na verdade
em nada crê. Como diz Hebreus, a fé é
a certeza... a fé é a prova.
Finalizando, ou começando; quem sabe
onde isso vai parar? Luto para que o diálogo teológico se torne mais humano,
como coisa de humanas é. De exatas, já
bastam a matemática e a física, que jamais alteram seus produtos, ainda que se
troquem a ordem dos tratores, na montagem do viaduto.
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